domingo, 25 de novembro de 2007

Uma menina do Brasil

Minha cara amiga Luci,

Eu bem queria lhe escrever uma carta, mas como o Lula vetou o projeto que aprova o adicional de periculosidade aos carteiros, resolvi não dar mais trabalho a eles. O que está a aprontar na Alemanha? Visitando aqueles castelos que são idênticos aos desenhados nos livros de nossa infância? Dando um rolê na floresta negra, aquela das árvores parecidas com as que nos botavam medo quando João e Maria se perderam?

Nessa semana descobriram mais petróleo aqui, Luci. Chegaram a dizer que Deus realmente é brasileiro. Parece que a descoberta, que fica no litoral paulista e que é chamada de campo de Tupi, coloca o Brasil numa posição muito boa. Quando a devastadora 3ª. crise do petróleo chegar, talvez não soframos tanto. Monteiro Lobato ia ficar feliz, não acha?

Mas, se Deus é brasileiro, Jesus talvez seja sueco, porque ninguém em sã consciência diria “vinde a mim as criancinhas” neste país.

Por uma denúncia anônima, nessa semana teve repercussão o caso de uma menina (L.) de 15 anos que foi presa e mantida por 26 dias em uma cela com 20 homens, em uma delegacia do Pará, por tentativa de furto. Imagina. A garota era estuprada e, caso se negasse a fazer o que os detentos ordenavam, era agredida. A população da cidade de Abaetetuba sabia do fato, pois a cela podia ser vista da rua. Tinham medo de denunciar. Aliás, iam recorrer a quem? Ouviam-na clamar por socorro e pedir comida. Ela passava fome e era queimada nos pés pelos cigarros dos presos. Seu cabelo foi cortado à navalha, quem sabe, para a esconder. O pai, agricultor, disse que a polícia o ameaçou à cadeia se não arrumasse um documento para provar que sua filha era maior.

Nesses dias, coincidentemente, vieram uns estrangeiros para atestar o que já sabemos: existe tortura no Brasil. Mas, aqui ninguém liga para direito de carcerário, não. Nem para o Estatuto da Criança e do Adolescente. Quem foi eleito pelo povo não toma atitude nenhuma para mudar as coisas. Você sabe o que comove de verdade essa gente: passeatas contra a violência urbana enfeitadas com flores vermelhas e alvos tecidos flamejando na brisa de Copacabana. Você acha que existem penitenciárias femininas em todos os estados brasileiros?

Direitos humanos, rárárá. O que importa para quem manda no país é que esse tipo de coisa nunca acontecerá aos filhos das 5 mil famílias que, segundo o Pochmann, se apropriam de mais de 40% da riqueza nacional (entre as mais de 51 milhões de famílias brasileiras), não é? Luci, a propósito, está dando nojo o modo pelo qual a imprensa está cobrindo o “mandato” do professor da Unicamp no IPEA...

É também notícia hoje que as 220 maiores empresas brasileiras obtiveram lucro líquido de R$ 39,3 bilhões, um recorde absoluto. Quanto aos bancos, Luci, não se preocupe: os lucros líquidos alcançados entre janeiro e setembro deste ano somaram o montante de R$ 18,48 bilhões (considerando Bradesco, Itaú, ABN Real, Santander e Unibanco), alta de apenas 90% em relação ao mesmo período de 2006.

Desde a constatação da situação de L., outros casos semelhantes estão pipocando nos jornais. Uma menina igual a mil.

"Ah, se eu pudesse não cantar essa absurda melodia para uma criança assim caída...” Ao som de Chico, despeço-me. E peço perdão por te mandar notícias tão ruins daqui. (Acho que não consegui desopilar o fígado ainda).




3 comentários:

Anônimo disse...

Oi Mé, muitas saudades… [...]
Sim, fiquei sabendo de algumas das “novidades” de nosso Brasil varonil...trash, como outras coisas que ainda não descobrimos. Com certeza há mais casos como o de L., e imagine o grau? Mas no JN, último bloco, só passeata em Copacabana com as gentes pedindo “Paz” ou “Basta de violência!” . De preferência vestidos de branco e com artistas globais...Meu cú!...por hora me livrei dessa
Danke! Minhas fontes são somente via internet. Adorei receber informações filtradas e seguras.
E essas notícias “positivas”? lucros assombrosos dos bancos, das grandes empresas...pro povo só no rabo né? Mas a ladainha do empresariado continua: precisa flexibilizar, desonerar, baixar os juros, diminuir a carga tributária...
É Deus pode até ser brasileiro, mas com certeza esse petróleo vai ser estopim pra alguma maracutaia política no futuro e lógico, teremos combusttível, mas pra quem puder pagar né? Talvez as 5 mil famílias citadas pelo Pochman...
Sim Liebe, estou cá eu na terra de Goethe, Rilke e Günter Grass – há de se ser contemporâneo afinal. Castelos, agora menos. Tenho que estudar. Mas sim, há muitos. A cidade é pequena, portanto linda e claro... provinciana. Gracias soy latina e como estrangeira tenho o direito de cometer extravagâncias e ser bizarra rárárá. [...]
Frio Mé, muito frio. Agora mesmo está 0º grau, nevando...na verdade uma tempestade de neve..O tempo é louco aqui: pela manhã garoa, na volta do curso tivemos um céu azul lindo, com sol, depois ficou preto e começou a chover, agora está nevando e já vejo no horizonte parte do azul do céu de novo...Que tempo doido!!
Fico por aqui, vou lavar o cabelo e fazer minha guirlanda pra colocar na porta.

Küsse und bis nächst mal*
Luci

*Beijos e até a próxima

Guiga disse...

irretocável.

Guiga disse...

Oi Mari, você paree estar bem ocupada por aí. Eu tô feliz pra CARALHO de saber que você já está em São Paulo, você não faz idéia do quanto eu amo São Paulo esta porra, do quanto esta cidade significa prá mim, e egora é seu novo endereço, mon dieu, MARIANA EU TÔ MORRENDO DE VONTADE DE TE VER, TODA VEZ QUE EU FICO BÊBADO COMO AGORA EU SÓ PENSO EM VOCÊ, VOCÊ É DEMAIS E NÃO VOU CAIR NOI CLICHE DO TE AMO PROMETO PORQUE VOCÊ OCUPA UM LUGAR MUITO IMPORTANTE NA MINHA VIDA, TÔ VENDO AGORA VOCÊ E O ALUÍSIO COM AQUELAS MUCHUILINHAS NAS COSTAS EM DIREÇÃO AO CÂMPUS URCA E EU TE PERCEBI E TE AMEI DE COSTAS!!! SABE DUMA COISA, É ISSO QUE ME FAZ SENTIR ALGUÉM, SABER QUE DESDE AQUELA ÉPOCA EU CONSEGUIA JÁ CONSEGUIA DESCONFIAREA DE TUDO E ERA CAPAZ DE PERCEBER ALGUÉM COMO VOCÊ. mARIANA SEJA BEM VINDA DE NOVO A SÃO PAULO, PORQUE ESTA CIDADE TEM DE AMAR, TE REVERENCIAR, E PODE TER CERTEZA ELA VAI FAZER ISSO PORQUE VOC~E É DEMAIS MARIANA.