O professor Fábio Campinho analisa o que está em jogo nas discussões entre o capital e o trabalho atualmente e mostra qual é o desafio que a classe trabalhadora tem a enfrentar. Confira:
Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Paraná, o advogado e professor Fábio Campinho (do pequeno PSOL) afirma que a flexibilização das leis trabalhistas ainda está na ordem do dia. Apesar do aparente clima de calmaria festejada em mega eventos por centrais governistas, segundo o entrevistado, o governo e os capitalistas estão percebendo que a crise dos EUA pode se alastrar e, assim, vão querer obrigar os trabalhadores a pagar a conta.
A intenção de flexibilizar o trabalho vem hoje estampada em documentos como o recém publicado “Diretrizes a respeito da reconstrução das relações entre o trabalho e o capital no Brasil”, elaborado pelo ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger. Lá estão as medidas que orientam a agenda legislativa no sentido de retirar direitos dos trabalhadores. Para ver esse documento clique aqui
1) Em sua opinião, qual o balanço do 1º de maio? Qual é a discussão central sobre as relações de trabalho no Brasil hoje?
Estamos em uma fase muito difícil! A correlação de forças entre capital e trabalho é claramente favorável ao primeiro. As organizações construídas pelos trabalhadores por quase três décadas (PT e CUT) se transformaram em instrumentos de acomodação dos interesses do capital. Neste contexto, a simples existência, nas maiores capitais do país, de um 1º de maio classista e de luta, que se difere dos mega-espetáculos das centrais governistas, já é algo que deve ser festejado. É preciso ter clareza das tarefas do momento.
2) Muitas vezes, o trabalhador não participa de sua organização de classe. A reforma sindical poderá criar mecanismos de representatividade e combatividade maiores?
O que tivemos até agora, durante o governo Lula, foram contra-reformas sindicais, algumas postas em prática, outras não. O grande projeto de contra-reforma sindical que saiu das discussões do Fórum Nacional do Trabalho em 2003, por enquanto, está adormecido. O que se vêm fazendo são contra-reformas pontuais. São duas as mais relevantes.
Em primeiro lugar houve o entendimento do Supremo Tribunal Federal de que a lei de greve dos trabalhadores da iniciativa privada também é aplicável aos servidores públicos. Medida que tem intuito claro de dificultar o exercício do direito de greve entre os servidores, especialmente porque, a partir desta decisão do supremo, passa a ser possível que a administração corte os salários durante o período de paralisação.
Em segundo lugar houve o reconhecimento legal das centrais sindicais. O problema é o objetivo que esteve por detrás disso. Tudo foi feito para que as centrais dividissem o bolo do imposto sindical. Verdadeiro absurdo! Lula, nas grandes greves de 1978, no ABC, não se cansava de dizer que a CLT era o AI-5 dos trabalhadores. Lutava contra a ingerência do Estado nos sindicatos, o sindicato único e o imposto sindical. É trágico ver como o discurso e a prática mudaram. Hoje, a CUT que nasceu da luta contra o imposto sindical é reconhecida pelo governo justamente para que possa receber uma fatia do imposto sindical.
3) O que está em jogo quando se diz que é preciso fazer uma revisão da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) para diminuir o custo do trabalho no Brasil e criar mais empregos?
O que se quer é nivelar por baixo. É introduzir no Brasil o padrão asiático de exploração do trabalho, como ocorre na China, nos Tigres Asiáticos e na Índia. Enfim, um sistema de livre mercado, em que não haja qualquer tipo de freio para o capital.
Essa estória de que precarizar é a saída para o problema do desemprego é uma grande falácia. O governo FHC criou o banco de horas, ampliou as possibilidades de terceirização, de contratação a prazo determinado, facilitou a vida das cooperativas fraudulentas, tudo em nome da criação de novos empregos. Conseguiu apenas mais desemprego. O baixo custo do trabalho serve, em momentos de crise, como estímulo à demissão e não à admissão de novos trabalhadores.
O leve aumento do emprego formal, de baixos salários, ocorrido durante o governo Lula se deu mais em virtude da onda de crescimento econômico global do que de medidas concretas de flexibilização das leis trabalhistas. Mas o governo e os capitalistas já estão percebendo que a crise nos EUA tende a se alastrar e que o breve período de bonança não vai durar muito. Por isso, o tema da flexibilização volta à ordem do dia.
4) A proposta feita por Mangabeira Unger de retirar a contribuição previdenciária dos empregadores da folha de salários é um modo eficaz de resolver os problemas do trabalhador brasileiro? Por quê?
De forma alguma. Jogar a contribuição dos empregadores para um imposto geral é abrir uma brecha enorme para que se dê outra destinação aos recursos arrecadados, alheia à previdência social. Se isso já ocorre hoje, segundo dados do próprio governo, com o desvio de boa parte dos recursos da previdência para garantir o superávit primário, imagine no caso de um imposto geral. Seria certamente uma sangria desatada, com claro prejuízo para os trabalhadores.
5) Pela sua leitura, o que o trabalhador brasileiro pode esperar daqui para frente? Qual é a saída?
Os tempos não são fáceis. Também não há saídas prontas. Temos um ex-operário na presidência, que, ainda que com certo grau de camuflagem, vem fazendo integralmente o jogo do grande empresariado, nacional e transnacional. É só ver os elogios aos usineiros. O trabalhador morrendo de tanto cortar cana e o presidente dizendo que os usineiros são “os heróis da nação”. A CUT e seus dirigentes só gerindo os grandes fundos de pensão das Estatais. É o “novo” sindicalismo financeiro!
Neste contexto árduo, é preciso reafirmar a necessidade de auto-organização dos trabalhadores, o caráter classista e autônomo dos sindicatos. É preciso fomentar a organização por local de trabalho, combater o corporativismo nos sindicatos e aproximar as lutas sindicais das de outros setores que estão fora do trabalho formal (os sem-teto, os sem terra, o movimento negro, estudantil, de mulheres, etc.), sem esquecer, é claro, das especificidades do movimento sindical. Nosso desafio é construir um instrumento de unidade capaz de impulsionar a solidariedade de classe e de colocá-la em movimento contra o capital. A Intersindical é um passo importante. Mas é necessário avançar, com calma e sem atropelos, para uma organização capaz de unir todos os setores combatentes dos trabalhadores.
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sexta-feira, 13 de junho de 2008
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